"É na
escola que de fato aparece a dislexia, uma perturbação de origem neurobiológica
e genética relativamente frequente, que deve ser diagnosticada o mais cedo
possível para que a intervenção ocorra de forma adequada."
Dislexia é um distúrbio específico de
aprendizagem, muito frequente na fase escolar, caracterizado
pela dificuldade em automatizar o código linguístico. Essa síndrome é
conhecida e estudada há mais de um século, porém apenas nos últimos anos passou
a ser difundida no Brasil. Estudos realizados no mundo todo apontam
que entre 5% e 17% da população mundial é disléxica.
Conhecia desde o fim do século 19, sua origem permaneceu um
mistério durante muito tempo. Só em 1968 é que a Federação Mundial de
Neurologia utilizou, pela primeira vez, o termo "dislexia do
desenvolvimento". Quase 30 anos depois, esse problema foi
incluído nos transtornos de aprendizagem, denominado por "perturbação
da leitura e da escrita". Cinco anos mais tarde, já em
2003, a Associação internacional de Dislexia adotou a seguinte
definição: "Dislexia é uma incapacidade específica de
aprendizagem, de origem neurobiológica, caracterizada por dificuldades na
correção ou fluência na leitura de palavras e por baixa competência leitora e
ortográfica, Essas dificuldades resultam de um déficit fonológico, inesperado,
em relação a outras capacidades cognitivas e às condições educativas, e que se
mantém ao longo da vida. Secundariamente, podem surgir dificuldades de
compreensão de leitura que impeçam o desenvolvimento do vocabulário e dos
conhecimentos gerais". Essa definição é aceita, atualmente, pela
maioria da comunidade científica.
A
Associação Brasileira de Dislexia (ABD) considera uma pessoa portadora da
dislexia quando, apesar da inteligência, da instrução, da oportunidade
sociocultural e da ausência de distúrbios cognitivos e sensoriais fundamentais,
há falhas no processo de linguagem, incluindo problemas com leitura e escrita.
Diagnosticar a doença não é fácil, pois requer a avaliação de uma equipe
multidisciplinar, formada por psicólogo, psicopedagogo, fonoaudiólogo e
neurologista. Vale ressaltar que o déficit cognitivo persiste ao longo da vida,
ainda que suas consequências e expressão variam sensivelmente.
Mas do que resultam essas dificuldades, em entrevista a
revista COISA DE CRIANÇA, a especialista e psicóloga educacional Paula
Teles, explica: " Já vimos que a origem da dislexia é neurobiológica e que
também há influências genéticas. Além disso, ela é motivada por alterações
estruturais e funcionais do cérebro".
Sinais
de alerta na primeira infância
Apesar de a dislexia ser uma perturbação da linguagem, que
acarreta dificuldades de processo fonológico, pode-se observar manifestações
desse quadro antes mesmo do início da aprendizagem da leitura. Se esses sinais
forem percebidos e persistirem ao longo de vários meses, os pais devem procurar
uma avaliação especializada. Os primeiros indicadores de possíveis dificuldades
com a escrita surgem com a linguagem oral. O atraso na aquisição da fala serve
como um alerta para futuros problemas na leitura.
As crianças começam a dizer as primeiras palavras com cerca
de 1 ano de idade e a formar frases entre os 18 meses e os 2 anos. Em situação
de risco, as primeiras palavras surgem depois de 15 meses e as frases somente
com mais de 2 anos. Veja a seguir alguns pontos fundamentais na identificação
da dislexia:
Depois de as crianças começarem a falar, surgem dificuldades
de pronúncia. Geralmente entendidas como “linguagem do bebê”, elas
continuam além do tempo normal. Por volta dos 5 anos de idade, uma criança deve
pronunciar corretamente a maioria das palavras;
A dificuldade em pronunciar uma
palavra pela primeira vez ou em falar corretamente palavras complexas pode ser
apenas um problema de articulação. As incorreções típicas da dislexia são a
omissão e a inversão de sons em palavras, como por exemplo, “fosfos”
(fósforos) e “popicas” (pipocas);
Frases curtas e palavras mal
pronunciadas, com omissão ou substituições de sílabas ou fonemas;
Dificuldade em aprender nomes de
cores (verde, vermelho), de pessoas, de objetos, de lugares;
Dificuldade em memorizar canções;
Dificuldade na aquisição dos conceitos temporais e espaciais
básicos (ontem/amanhã, manhã/amanhã, direita/esquerda, antes/depois);
Dificuldade em perceber que as frases são formadas por
palavras e que as palavras podem ser divididas em sílabas;
Não saber as letras do próprio nome;
Dificuldade em aprender e recordar os nomes e os sons das
letras;
Dificuldade em associar os rótulos a seus produtos;
Dificuldade para a organização sequencial (por exemplo, as
letras do alfabeto, os meses etc.);
Lentidão na cópia;
Desatenção e dispersão.
Avaliar
e intervir
Em caso de suspeita da existência de déficits fonológicos e
de dificuldades de leitura e escrita, deve-se fazer uma avaliação. É importante
observar para diagnosticar, delinear as dificuldades especificas, as áreas
fortes e, assim, intervir.
A avaliação pode ser realizada em qualquer idade e os testes
são dirigidos a cada criança. Com base nos resultados obtidos, implementam-se
as medidas de intervenção adequadas. Professores e pais precisam ficar atentos
aos sinais que podem evidenciar dificuldades antes do início da escolaridade,
pois a implementação de programas de intervenção precoce tende a prevenir ou
minimizar o insucesso.
Hoje, sabe-se que é possível introduzir melhorias por meio
de uma intervenção especializada, " reorganizando" os circuitos
neurológico e implementando um programa reeducativo concebido com base nos
novos conhecimentos neurocientíficos.
Na escola, no entanto, pequenas ações já devem ser
dirigidas ao aluno comprovadamente disléxico. Sugerimos algumas:
Use linguagem direta, clara e objetiva. Muitas crianças têm
dificuldade para entender uma linguagem simbólica, sofisticada e metafórica;
portanto, seja simples;
Fale olhando diretamente para ele;
Coloque-o sempre próximo ao professor para facilitar o
diálogo e a orientação;
Trate-o com naturalidade;
Evite submete-lo à pressão de tempo e competição entre
colegas, pois suas dificuldades para automatizar a leitura e escrita
transformam algo simples em uma operação altamente complexa;
Atenção: em geral o disléxico tende a lidar melhor com as
partes do que com o todo. Abordagens e métodos globais e dedutivos são de
difícil compreensão para ele. Apresente o conhecimento em partes, de modo
indutivo.
Extraído da revista: O guia
para Educadores - Maio de 2009 - Nº 2
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